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OS DEMÔNIOS EM CASA

ESPECIAIS/VE DEMÔNIOS

autorGilberto Schoereder
publicado porGilberto Schoereder
data13/06/2017
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Mesmo sem serem convidados, os demônios começaram a invadir residências, tomando o lugar dos fantasmas.

De uns tempos para cá, parece que os demônios andaram invadindo várias casas assombradas e expulsaram os fantasmas, provavelmente na porrada. O que antes era um tema comum no terror, as casas assombradas por fantasmas, tornou-se casas habitadas – e, claro, assombradas – por demônios de várias espécies. É verdade que em boa parte das histórias, especialmente no cinema, os autores não se preocupam em distinguir espíritos do mal de demônios, o que complica um pouco a identificação; mas, como em sua maior parte são filmes ruins ou apenas medianos, tanto faz.
Apesar de muitas vezes ter recebido críticas não muito favoráveis – tanto em sua versão literária quanto a do cinema – uma história bem legal nesse tema é A Entidade (The Entity, 1978), livro de Frank De Felitta (1921-2016), levado ao cinema em 1982 com o título Enigma do Mal (The Entity), com direção de Sidney J. Furie.
Segundo se diz, a história foi inspirada em um caso real de uma mulher que afirmava ter sido estuprada por três espíritos. No livro, a mulher é Carlotta Moran (no filme, Carla), que começa a ser inexplicavelmente assediada por um ser demoníaco que a violenta e machuca.

Barbara Hershey sofrendo com o ataque da entidade, em O Enigma do Mal (American Cinema Productions).

Ao contrário de muitos livros de terror da época, esse dá maior destaque à atuação da ciência – no caso, a parapsicologia – do que à religião e os poderes psíquicos. O livro tem a vantagem sobre o filme de apresentar com maior profundidade os problemas psicológicos da mulher, no filme interpretada por Barbara Hershey, papel que lhe deu o prêmio de melhor atriz no Festival do Cinema Fantástico de Avoriaz.
 

 

 

A Força do Mal (Belford Productions/ CBS Entertainment Production).

Alguns anos antes, em 1972, Steven Spielberg também já havia apresentado um demônio que se sentiu bem à vontade numa casa, em A Força do Mal (Something Evil), produção feita para a TV com Sandy Dennis, Darren McGavin e Ralph Bellamy. O filme foi realizado logo após Encurralado (Duel, 1971), mas não conseguiu atingir o mesmo sucesso. Ainda assim, é bem interessante, mostrando um casal que se muda para uma casa numa região rural. A esposa logo começa a perceber que algo está errado no local, e ela sente que está sendo ameaçada por forças do mal, e o filho deles é quem acaba sendo possuído. Como ninguém dá muito crédito ao que ela pensa e sente, ela mesma aprende alguns truques para combater o demônio (ou demônios) que habitam a casa.

 

                                                                                                                                           A Casa das Almas Perdidas (FNM Films/ 20th Television).

Em 1991, o filme feito para TV, A Casa das Almas Perdidas (The Haunted), dirigido por Robert Mandel, apresenta não apenas um demônio vivendo no local, mas ainda alguns espíritos. Nenhum deles é legal.
Tem o motivo comum da família que se muda para uma nova casa e começa a enfrentar problemas. Aqui, eles começam alguns anos depois da mudança, e o pai da família só se convence de que eles estão com problemas quando ele mesmo é estuprado por um demônio.
Eles descobrem que o objetivo do demônio é acabar com o casamento deles, o que, convenhamos, é um objetivo bem idiota para um demônio. Apenas aparentemente eles conseguem se livrar do assédio demoníaco, mas quando se mudam para outra casa, o demônio vai junto. Parece mais um caso de paixão doentia do que de possessão propriamente dita.

 

Os demônios habitaram algumas casas ao longo dos anos, geralmente em filmes sem importância, mas voltaram a ganhar destaque em 2007, com Atividade Paranormal (Paranormal Activity), dirigido por Oren Peli, que teve uma história bem amarrada e uma bilheteria absurda.
Que tal fazer um filme com um orçamento de 15 mil dólares e, três anos depois, ter faturado quase 200 milhões de dólares? Nada mal, não é? Em especial para um filme tão despretensioso e, ao mesmo tempo, tão efetivo em suas propostas.
Os jovens namorados Katie e Micah mudam-se para uma casa em San Diego. Ele, animadíssimo com sua nova câmera, passa a filmar tudo o que fazem, para irritação dela. Aos poucos, percebem que eventos estranhos acontecem na casa, e ela diz que era assombrada por um ser estranho desde sua infância, e que ele a segue para onde quer que ela vá. Inicialmente descrente, aos poucos o namorado percebe que a situação é mais complicada do que imaginava, e chega a chamar um “psíquico”, que diz que não se trata de um fantasma, mas de um demônio, o que torna a situação mais complicada.

Atividades estranhas durante a noite, em Atividade Paranormal (Paramount Pictures/ Solana Films/ Blumhouse Productions).

Eles passam a deixar a câmera ligada durante a noite, virada para sua cama e a porta do quarto, de modo que se pode perceber as coisas estranhas que vão acontecendo na casa, como a porta movendo-se sozinha ou o som de passos pesados na escada.
Como em qualquer bom filme de terror, os acontecimentos vão se tornando cada vez mais presentes, aterrorizantes e fisicamente perigosos, até culminar com mortes. Foram feitos três finais diferentes, um deles produzido pela Paramount Pictures, que comprou os direitos após as primeiras exibições do filme; os finais são ligeiramente diferentes. O mais interessante no filme é, sem dúvida, o fato de que nem tudo é mostrado – uma técnica utilizada em alguns dos melhores filmes de terror de todos os tempos. A utilização de sons altíssimos referentes a algo que está acontecendo fora do ângulo de filmagem, coloca o espectador na mesma situação dos personagens, sem saber do que se trata e sem verem o mal que se apossa da casa e, eventualmente, da personagem Katie. É verdade que essa técnica de utilizar a câmera subjetiva já tinha sido utilizada com sucesso em A Bruxa de Blair e depois foi repetida com muita capacidade em Cloverfield Monstro, para ficarmos nos exemplos mais visíveis, mas talvez em nenhum desses filmes com tanto impacto quanto em Atividade Paranormal. O filme é realmente assustador, e o sucesso de público originou uma enxurrada de produções semelhantes, além das próprias sequências: Atividade Paranormal 2 (Paranormal Activity 2, 2010); Atividade Paranormal 3 (Paranormal Activity 3, 2011); Atividade Paranormal 4 (Paranormal Activity 4, 2012); Atividade Paranormal: Marcados Pelo Mal (Paranormal Activity: The Marked Ones, 2014); Atividade Paranormal: Dimensão Fantasma (Paranormal Activity: The Ghost Dimension, 2015).

Os problemas continuam, em Atividade Paranormal 2 (Paramount Pictures/ Blumhouse/ Solana Films/ Room 101).

Algumas coisas mudam, outras continuam exatamente as mesmas, às vezes com outra roupagem. As diferenças entre o filme original e o segundo da série são fáceis de serem percebidas: o orçamento pulou de 15 mil dólares para quase 3 milhões; existem equipes de efeitos visuais, especiais e de maquiagem; a equipe de som é maior; em vez de uma câmera na mão, existem várias câmeras de segurança espalhadas pela casa, e uma câmera na mão; Oren Peli não fez de tudo no filme.
No mais, é uma refilmagem da primeira história, mostrando mais do que mostrava o original, em novos ângulos de filmagem. Tem seus momentos aterrorizantes, é verdade, mas ainda assim não deixa de ser o mesmo filme, novamente. Ele é apresentado como uma introdução – a famosa prequel, uma praga que o cinema norte-americano inventou de fazer de uns anos para cá – contando os eventos que originaram ou antecederam o primeiro filme. Como os demais da sequência, é totalmente dispensável.