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ALÉM DO PLANETA SILENCIOSO

Livros/Lançamentos

autorGilberto Schoereder
publicado porGilberto Schoereder
data14/10/2010
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A Martins Fontes publica a primeira parte da trilogia de C.S. Lewis, uma das mais conhecidas da ficção científica.

A história registra que C.S. Lewis resolveu escrever Além do Planeta Silencioso (Out of the Silent Planet, 1938) após uma conversa com J.R.R. Tolkien. Lewis resolveu escrever uma obra que envolvesse uma viagem espacial, enquanto Tolkien escreveria uma obra sobre viagem no tempo. A história de Tolkien não foi adiante e só existe como um esboço, publicado anos depois por seu filho Christopher, no livro The Lost Road and Other Writings – no qual a introdução “The Early History of the Legend” explica a troca de correspondência com C.S. Lewis a composição de The Lost Road.
Por sua vez, Lewis não apenas escreveu Além do Planeta Silencioso como deu sequência ao projeto com os livros Perelandra (ou Voyage to Venus, 1943) e That Hideous Strength (1945). A série foi chamada de Trilogia Espacial, ou Trilogia Cósmica, ou ainda Trilogia de Ransom, o nome do personagem central da obra. Os três livros foram publicados em Portugal e circularam pelo Brasil com os títulos Para Além do Planeta Silencioso, Perelandra – Viagem a Vênus e Aquela Força Medonha.
A semelhança entre C.S. Lewis e J.R.R. Tolkien reside no interesse de ambos pela qualidade da ficção elaborada em sua época. A abordagem de ambos em suas obras não poderia ser mais diferente no que diz respeito ao aspecto religioso. Enquanto Tolkien foi resgatar conhecimentos pagãos do passado distante, Lewis concentrou-se no pensamento cristão, recheando a obra de referências a anjos, demônios e Jesus Cristo, e nesse aspecto em particular compondo um dos pontos altos da literatura do gênero.
Lewis apresenta a história do conflito básico e eterno entre as forças do Bem e do Mal – representadas em muitas religiões do planeta, mas em particular nas cristãs – e o expande para nosso sistema solar, imaginando cada planeta com uma função específica nesse confronto, ou ajuste de energias.
O personagem central, Elwin Ransom, que é levado à força para o planeta Malacandra, ou Marte, onde consegue fugir de seus captores e aprender muito sobre a vida da sociedade local e as forças que estão em conflito no universo e em cada planeta. Ao comparar a vida no planeta com a vida na Terra, Ramson percebe cada vez mais os problemas existentes aqui, e o tipo de vida espiritual que existe em Malacandra. Os habitantes lhe informam que a Terra se tornou um mundo decadente, uma vez que seu deus – que pode ser visto como um poder alienígena – se tornou malévolo, com desejo de expandir seu poder, tendo de ser contido pelos deuses – ou anjos – dos demais planetas.
Um dos pontos interessantes no que diz respeito à elaboração do texto como ficção científica, é que C.S. Lewis apresenta a ciência como um dos instrumentos do Mal, provocando o desequilíbrio na Terra. Na época, no início da literatura de ficção científica, em geral a ciência e a tecnologia eram apresentadas de forma bastante positiva, ao contrário do que ocorreria a partir dos anos 1960.
Também é bastante interessante o conceito de que nosso planeta se encontra de certa forma “isolado” do resto do universo, cercado por um escudo de proteção criado por uma força maléfica, o que é bastante parecido com alguns dos conceitos levantados por Philip K. Dick em diversos de seus livros.
Apesar de C.S. Lewis ainda ser mais conhecido do grande público por seu As Crônicas de Nárnia, a trilogia espacial talvez seja mais consistente na discussão de temas ligados à religião – ainda que o aspecto moral apresentado nos livros já tenha sido visto como o elemento mais fraco dessa criação.