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SÉRIES NA PANDEMIA

Séries de TV

autorGilberto Schoereder
publicado porGilberto Schoereder
data07/04/2021
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The Collapse – The Orville – Devs – The Third Day – Beforeigners
(Canal +)

Vou começar pela série mais inesperada, pelo menos para mim: The Collapse, também apresentada como O Colapso. Na verdade, trata-se de uma série francesa produzida em 2019 com o título original L’Effondrement que, traduzindo, significa... bem, O Colapso.
Foi apresentada como uma minissérie com oito episódios curtos, com duração entre 15 e 28 minutos. E confesso que não esperava grande coisa pelo trailer apresentado pela AMC, mas é sensacional. Certamente, entre as melhores produções que vi nos últimos tempos, juntamente como Counterpart e Years and Years.
Cada episódio é fechado em si mesmo, com a ação situada em um ambiente específico, e cada qual mostrando diferentes aspectos de uma sociedade em queda vertiginosa. Não existe uma explicação absolutamente clara sobre como o planeta chegou ao ponto em que se encontra, mas entende-se que a economia mundial entrou em colapso irreversível. Os bens de consumo desaparecem das prateleiras dos supermercados, a gasolina some dos postos de gasolina, o fornecimento de energia elétrica também é comprometido, para não falar nos problemas com as usinas nucleares.
Hordas de pessoas abandonam as maiores cidades temendo a violência que se inicia e procurando a sobrevivência em algum lugar do interior. Os mais ricos têm algum tipo de plano de emergência, o que implica em deixar tudo para trás e isolar-se em uma ilha. Os que nunca puderam pagar por privilégios também não terão esse último plano de fuga.
Além de retratar com crueza a crescente e terrível situação da sociedade, os episódios também mostram que, em momentos de crises, os seres humanos podem revelar seu lado mais abominável, mesquinho e criminoso.
O oitavo e último episódio mostra eventos anteriores ao colapso, destacando a inépcia dos políticos em perceber e corrigir o caminho inevitável que a humanidade estava seguindo.
Uma beleza.

 

Seth MacFarlane e Adrianne Palicki (Fuzzy Door Productions/ 20th Century Fox Television).

Um dia, estava zapeando e encontrei o seriado The Orville (2017), já em sua segunda temporada. Como é uma criação de Seth MacFarlane – já conhecido pelas animações Family Guy e American Dad – resolvi dar uma olhada, e não me decepcionei.
A série é escancaradamente baseada em Jornada nas Estrelas – tanto a série original quanto A Nova Geração – como uma homenagem, mas também como paródia, com o humor inteligente que tem marcado a produção de MacFarlane.
Por alguma razão misteriosa, o canal Star Hits 2 vem repetindo ad nauseum a segunda temporada, e jamais a primeira.
Mas vale a pena assistir. Não é sempre que se vê em uma série de ficção científica um capitão de uma nave, o próprio MacFarlane, com um boneco do sapo Caco em cima de sua mesa. Ou um casal de alienígenas machos, provenientes de um planeta em que as crianças do sexo feminino, quando chegam a determinada idade, são estimuladas a mudar de sexo.
Assim como a Enterprise, a nave, a Orville, viaja pelo universo entrando em contato com diversas civilizações em nome da União Planetária, no século 25, e encontrando uma série de problemas, inclusive internos. E tudo sempre tratado ao mesmo tempo com seriedade e bom humor.
Originalmente, a primeira temporada foi exibida em 2017, e a segunda começou em dezembro de 2018 e estendeu-se até abril de 2019. Até onde se sabe, a terceira temporada deve estrear ainda em 2021, mas agora no canal Hulu, de modo que não se sabe se vai chegar ao Brasil.

 

Nick Offerman e Sonoya Mizuno (DNA Films/ FX Productions/ Scott Rudin Productions).

Já quanto a Devs (2020), não sei muito bem o que pensar. Foi criada por Alex Garland e desenvolvida em oito episódios, no Brasil também apresentados no canal Star Hits, antiga Fox. Garland é o diretor de Ex-Machina: Instinto Artificial (Ex Machina, 2014) e de Aniquilação (Annihilation, 2018), além de ser um roteirista conhecido por seus trabalhos no excelente Não me Abandone Jamais (Never Let me Go, 2010) e em Sunshine – Alerta Solar (Sunshine, 2007).
É uma minissérie, no mínimo, estranha, com personagens que estão sempre sérios, sombrios. A história gira em torno de uma empresa de tecnologia chamada Amaya, nomeada em homenagem à filha falecida do CEO da empresa, interpretado por Nick Offerman. Uma das engenheiras de software da empresa, Lily Chan (Sonoya Mizuno) tenta desvendar alguns mistérios envolvendo a morte de seu namorado, também funcionário, o que a leva ao conhecimento e envolvimento em um projeto secreto da empresa, Devs.
Em sua maioria, as cenas são bastante lentas, o que se imagina que deveria criar uma atmosfera mais densa, mas que não tem esse efeito. Devs é um projeto difícil de ser entendido, às vezes tido como uma possibilidade de ver o futuro, outras vezes, apresentando imagens do passado, mas talvez de um passado que não é exatamente o nosso, mas de um dos universos paralelos possíveis. E, ao final, alguns personagens acabam vivendo em um ambiente virtual mais parecido com o de Matrix ou alguma coisa saída da cabeça de Philip K. Dick.
Não que isso tudo seja necessariamente ruim, mas é indefinido, trazendo mais confusão do que algum tipo de esclarecimento.

 

                Jude Law (Plan B Entertainment/ Punchdrunk International/ SKY Studios).

A minissérie The Third Day (2020) foi apresentada pela HBO e filmada na Inglaterra, mais exatamente na ilha Osea, e tem Jude Law como principal protagonista, em atuação excelente. Ele chega ao local sem que se saiba exatamente como, e logo está no centro de eventos sinistros envolvendo uma antiga religião local em torno de um deus chamado Esus. Os moradores acreditam que o destino do planeta está nas ações realizadas na ilha, à qual só se pode chegar por meio de uma pequena estrada que fica submersa durante a maré alta.
O aspecto da religião ancestral lembra muito o que foi apresentado no filme O Homem de Palha (The Wicker Man, 1973), produção inglesa dirigida por Robin Hardy, com a presença de Christopher Lee – em história que foi refilmada no tenebroso O Sacrifício (The Wicker Man, 2006), com Nicolas Cage.
Existem muitos mistérios em torno do personagem Sam (Law), que parece ter perdido parte de sua memória, e que pode ou não ter visitado o local anteriormente. Ao mesmo tempo, ele é afetado pela morte violenta de seu filho e por eventos que presencia quando está próximo da ilha. E as atitudes dos estranhíssimos moradores locais só aumentam sua paranoia.
Em alguns momentos, as filmagens dão a impressão de que Sam está delirando ou passando por uma viagem de LSD, o que faz com que em boa parte da minissérie não tenhamos certeza sobre o que está realmente acontecendo, o que é realidade e o que é delírio de Sam.
A série foi dividida em duas partes, com a segunda iniciando aparentemente sem relação com os eventos iniciais, quando uma mulher – interpretada por Naomi Harris, também em excelente atuação – chega à ilha com suas duas filhas. Mas aos poucos a história vai se fechando, com os moradores da ilha divididos em uma batalha terrível pelo poder, e com fatos do passado surgindo para assombrar a todos.
É uma minissérie sensacional, com um clima de terror cuidadosamente construído, não apenas pela história criada por Felix Barrett e Dennis Kelly, mas pelas filmagens que procuram com ângulos diferentes, conseguindo criar um clima que lembra muito os filmes de terror ingleses das décadas de 1960 e 1970.

 

Nicolai Cleve Broch e Krista Kosonen (Rubicon TV AS).

A interessante série Beforeigners (2019), da HBO, foi produzida na Noruega com atores locais e segue na linha de séries como The Leftovers (2014-2017), da própria HBO, e Les Revenants (2012-2015), baseada no filme Eles Voltaram (Les Revenants, 2004), que também teve uma adaptação norte-americana com The Returned (2015).
Na nova série, em vez de pessoas vivas desaparecendo misteriosamente ou de mortos reaparecendo em nosso mundo repentinamente, são pessoas do passado que surgem no mundo moderno. As aparições são precedidas de uma luz abaixo da superfície da água e, em seguida, as pessoas do passado aparecem. Algumas morrem afogadas, outras são resgatadas por equipes da polícia e levadas para avaliação médica.
Alguns anos após o início do fenômeno, algumas adaptaram-se à vida moderna melhor do que outras, e elas vêm de vários períodos, de modo que existem comunidades de vikings e pessoas da Idade da Pedra, assim como habitantes do século 19.
As ruas de Oslo são mostradas repletas de moradores vindos do passado, ainda mantendo alguns de seus costumes ou convivendo perfeitamente bem com a tecnologia atual, o que não significa que não existem problemas de relacionamento. Se alguns países europeus têm sérios problemas com relação a imigrantes, dá para imaginar como eles reagiriam a imigrantes de outros tempos, com outra cultura, idioma, valores morais e com outras crenças religiosas.
A ação centra-se em uma dupla de policiais. O policial dos tempos atuais, Lars Haaland (Nicolai Cleve Broch), tem problemas com o vício em uma nova droga; a policial do passado, Alfhildr Enginnsdóttir (Krista Kosonen), é a primeira “viajante do tempo” a entrar na força policial e tem um passado como guerreira viking, passado que ela esconde, uma vez que a política proíbe guerreiros de trabalhar na polícia. Eles são encarregados de investigar o assassinato de uma mulher e, à medida que avançam em suas descobertas, percebem que a morte pode estar relacionada à natureza dos eventos temporais que continuam ocorrendo, além de indicar o envolvimento de alguns dos grupos do passado.
Existem muitos mistérios a serem revelados na série, cuja segunda temporada já foi confirmada pela HBO.